domingo, 6 de fevereiro de 2011

Pato bravo


“Black Swan”, de Darren Aronofsky, é um mosaico cinéfilo-literário bem entrosado, que glosa a história d’“O lago dos cisnes”: a mulher aprisionada que só se libertará pela morte. Este thriller psicológico, ambientado numa companhia de ballet, segue os passos de Nina (exímia Natalie Portman), uma rapariga perfeccionista e retraída que é escolhida para interpretar a mulher-cisne branco do bailado, doce, tímida e nervosa, e a sua dupla, a mulher cisne-negro, lasciva, sedutora, terrífica. Nina, toda candura, terá de aprender a sujar-se, se quiser interpretar o cisne negro de forma convincente. Mas Nina está aprisionada num corpo frio, espiado por uma mãe invejosa e tirana. Aliás, só as cenas caseiras entre mãe e filha dariam um valente filme de terror. O percurso de Nina é penoso. O corpo enche-se de mazelas, o espírito turva-se com paranóias e tudo se passa na sua cabeça, felizmente. Se aquela história se tornasse num caso de polícia ou num filme de terror com bonecada perderia todo o brilho para mim.
Aos poucos, atiçada por uma colega que vê como rival, Nina liberta-se, atira uns gritos à mãe e toma o controlo. Ansiávamos por vê-la dançar o cisne negro no dia da estreia, transfigurada, e é mesmo arrebatador.
Aronofsky doseou bem os géneros. Assumiu, entre outras, a influência de “A Mosca”, de Cronenberg, e lá está, e bem, a contribuir para a beleza estranha e inquietante deste filme.

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