segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Nascemos velhos

Gostei de conhecer Constantin e Elena, que surgiam com gestos vagarosos de velhos no documentário de Andrei Dascalescu. Numa casa exígua de uma aldeia romena, atulhada de bricabraque, de tapetes tradicionais e de panelas, assistíamos às suas ocupações e aos apartes e comentários que iam atirando um ao outro na cumplicidade segura de um casamento cinquentenário. Pareciam os meus avós paternos, quando ainda eram um casal, no modo como falavam dos bailes da juventude e com aquela de já terem nascido velhos, com a carga de trabalhos que lhes calhou na vida, naquele mundo um pouco sujo da aldeia.
Constantin e Elena são dois velhos romenos que esperam pacientes a morte e que, no entretanto, se alegram com a vinda dos bisnetos, com mais uma Páscoa (belíssima aquela cena em que preparavam pães doces para a festa) ou com o carteiro que lhes traz a pensão.
O que andarão a fazer agora? Elena estará talvez a ajudar Constantin a vestir o seu corpo bojudo para a missa, onde ele canta no coro, ou a fazer no tear mais uma linha do seu tapete de flores. Constantin poderá estar a esta hora a sorver ruidosamente uma caneca de leite com café e chocolate, a rir-se desdentado de uma história qualquer ou a acender uma vela na campa do filho morto. E se lhe oferecerem outra vez uma lata de Pepsi, será que vai de novo emborcar um copo cheio, estalar os dedos e dizer para o ar, muito sério ai, que grande bebedeira que eu vou apanhar?

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